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  2011 REVISTA ORGULHO  -  Orgulho

 
Sander, o desbravador
Mais do que assumir sua sexualidade ele luta pelo Movimento Gay em Alfenas
Por Mariana Terra
NOME: Sander Simáglio

UMA PALAVRA: coragem

UM MOMENTO: minha posse na Câmara

UMA MÚSICA: Tocando em frente, de Almir Sater

UM LIVRO: Quando Nietzsche chorou

UM FILME: Meia-noite em Paris

UMA MULHER: Madre Tereza de Calcutá

UM HOMEM: Chico Xavier

VIDA: vivo intensamente

UMA SAUDADE: minha avó

FAMÍLIA: meu alicerce

UM SONHO: ser prefeito

UMA BEBIDA: caipirinha

TRAIÇÃO: fraqueza

UMA MANIA: desocupar caixas, embalagens. Gosto de espaço. Não suporto entulhos sem serventia

UM DEFEITO: por demais ansioso

UMA QUALIDADE: verdadeiro

UM VICIO: internet

DESCREVA-SE: positivo, persistente, vaidoso, moderno, inquieto, ansiosíssimo, ousado, extravagante, louco, livre, feliz, ariano determinado, corajoso, ciumento, possessivo, romântico e carinhoso! Sou bem resolvido, prático e objetivo! Ah... E muito polêmico. Detesto discussões fúteis. Moro sozinho porque gosto das coisas do meu jeito e porque odeio dar satisfações. Sou independente para ter o DIREITO de curtir a vida como eu bem entender. Gosto de ARTE porque ela me torna uma pessoa melhor. Adoro a vida, sou humanista e me entrego completamente aos meus instintos - em outras palavras: eu não controlo o meu tesão! Gostaria de ser mais frio, para evitar as paixões com mais facilidade, porém quanto mais sofro mais sensível fico — mais humano me torno. Não julgo, não condeno, pois tudo me parece humano, até mesmo o mal que me fazem.




Sander Simaglio Maciel poderia ser um mineiro qualquer, mas a vida se responsabilizou por fazer dele um homem para ficar marcado na história da singela cidade de Alfenas, em Minas Gerais.


Nascido em 30 de março de 1977, foi batizado na igreja católica. Fez primeira comunhão, crisma e até foi corinha. Teve uma infância, digamos, feliz, tirando o fato de que uma vez ele foi o único a ficar sem presente de Natal. “Numa noite de Natal, na casa de uma amiga da minha mãe, uma senhora que participava da ceia levou presentes para todas as crianças presentes e os distribuiu. Fui o único que não ganhou. Eu tinha uns 5 anos e me lembro disso como se fosse hoje”.


Desde cedo começou a se virar para ganhar o seu dinheiro. Foi vendedor de roupas, perfumes, joias, objetos. Trabalhou em feira e supermercado e chegou a fazer entregas de listas telefônicas. Em 1994, deu um novo rumo à sua vida ao iniciar a Faculdade de Direito, na Unifenas. Escolheu o curso por sentir a necessidade de lutar pelos seus direitos, já que após ter se assumido percebeu que para a sociedade “era um cidadão de segundo plano com deveres garantidos e direitos negados”. Com a sexualidade assumida de vez escreveu a monografia Parceria Civil Registrada Entre Pessoas Do Mesmo Sexo. Com o trabalho, Sander conquistou uma imagem mais conhecida e positiva pelo lado da homossexualidade que até então era vista em travestis se prostituindo nas ruas ou de gays que morriam de AIDS.


Assumir a sexualidade não foi uma coisa fácil. “Eu não queria, lutava contra, mas lutar contra a natureza é impossível”. Com isso, Sander Simaglio foi passando pelo processo de auto-aceitação, o qual julga ser o mais difícil. Determinado, lutou por seu espaço e mostrou que não poderia ser diferente da sua essência.


Com sua homossexualidade muito bem assumida, começou a luta pelo movimento gay. Positivo e persistente, não deixou que ninguém o atrapalhasse na busca do seu sonho. Em 2000, juntamente com um amigo, fundou o Movimento Gay de Alfenas, mais conhecido como MGA.


A ideia de criar um movimento gay em Alfenas surgiu de uma viagem feita a Juiz de Fora, onde conheceu o movimento LGBT organizado naquela cidade. “Disse para mim mesmo: ‘Vou fazer o mesmo em Alfenas’. A maior dificuldade foi descoberta foi encontrar outros gays que topassem "dar a cara a tapa", tanto é que na fundação da ONG a maioria era heterossexual simpatizante à causa. De gay tinha apenas Sander e um amigo de uma cidade vizinha.


Sander se considera realizado. Pelo menos um dos seus sonhos foi concretizado — a criação de uma ONG, que defende os direitos humanos de homossexuais em toda região sul de Minas. “Sou 100% feliz graças ao trabalho voluntário que realizo na ONG com ‘pessoas de verdade’ que assumem o que são e sentem orgulho disso.”

Com a fundação do MGA, o alfenense passou a organizar as paradas gay’s da cidade, que este ano chegaram à oitava edição, não se pode comparar com as de grandes capitais, mas é um evento e tanto.


Mesmo carregando a imensa e prazerosa tarefa, tem orgulho de ser um “desbravador” do homossexualismo na cidade, estado e país. Já que também contribuiu de diversas formas para isso na Fundação Mineira de Homossexuais e na Associação Brasileira de Gay’s. Com estas ações Simaglio julga ter a possibilidade de "salvar vidas” de jovens gays, lésbicas, travestis que, naturalmente, tem conquistado seus espaços, deixado e mudado as tristes estatísticas de suicídios entre adolescentes LGBTs para uma realidade de vida.


Sander é inconformado com a incoerência existente em relação ao homossexualismo: “No mesmo país da maior parada gay do mundo, que é a de São Paulo, e que atrai mais de quatro milhões de pessoas, é o país que mata um homossexual a cada 48 horas pelo simples fato de ser o que é.” Infelizmente, existe muito preconceito e ele o encara: “Essa é a vida que tenho e prefiro viver na dor da verdade à da clandestinidade como boa parte de gays que casam com mulheres, possuem filhos e acabam destruindo suas vidas e de seus próximos”.


Sendo um cara viajado, que já participou de diversos congressos e palestras pelo País, percebe que a aceitação do homossexual numa cidade grande e em uma cidade interiorana como Alfenas é muito diferente. “Os grandes centros não têm tempo para cuidar um da vida do outro. É cada um por si e Deus por todos. Em cidades do interior prevalecem a fofoca e a intriga. Alfenas se destaca positivamente nesse sentido, por ter o movimento homossexual organizado e este inserido na sociedade, o que quebra um pouco o preconceito”, diz.


Política — Entrar na política foi muito natural, que já estava envolvido de “corpo e alma” no movimento social. Sander conquistou um espaço ainda maior ao se candidatar e ser eleito vereador pelo PV. Pela primeira vez, o parlamento alfenense tem um vereador do PV. Sander era o mais jovem da legislatura 2009—2012. Na posse como vereador, disputou o cargo de 1º secretário e foi eleito por unanimidade.


Atualmente na Câmara é Presidente da Comissão de Direitos Humanos e das Frentes Parlamentares de Luta contra o HIV/AIDS, Tuberculose e Hepatites Virais e de Apoio à Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais. É representante da Câmara como titular no Conselho de Defesa do Meio Ambiente, na Comissão Municipal de Geografia e Estatística do IBGE, no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico de Alfenas e no Conselho Superior da Unifal. Em janeiro de 2011, foi empossado 2º Secretário da Mesa Diretora para o biênio 2011/2012.


Mesmo tendo conquistado bastante espaço, o jovem vereador acha que ainda tem muita coisa a se fazer na política alfenense: “A política em Alfenas ainda é pobre, principalmente a do Legislativo. A produção é ínfima.” O seu jeito é um modo novo de fazer política e isso tem incomodado uns e acordado outros. “Faço o que gosto e este é o segredo das coisas darem certo. Não sei fazer pela metade. Assim foi me assumir gay, fundar o MGA, realizar a parada gay e, agora, a política. Falta engajamento por parte dos nossos políticos. Falta brio de pensarem mais no coletivo e menos no pessoal.”



“É preciso amor pra poder pulsar...”

Em 2005, por meio de um grande amigo, André Novais conheceu o Movimento Gay de Alfenas. “Nunca tinha visto coisa igual. Uma casa, no centro da minha cidade, com uma bandeira gay imensa, onde havia outras pessoas que eu me identificava!”


Aquela casa nos primeiros minutos se tornou um grandioso castelo no imaginário de André. Castelo esse, que a partir daquele momento, seria um lugar onde ele poderia defender os seus direitos, fazer novas amizades e poderia até lhe oferecer um emprego num futuro bem próximo!


O menino então começou a desbravar cada centímetro daquela grandiosidade, que na época se localizava de fronte à Escola Estadual Dr. Emílio da Silveira. “Havia uma cozinha onde todos podiam compartilhar momentos de muita alegria, uma sala com cadeiras e um telão onde todas as terças-feiras podíamos nos divertir com um filme novo, sempre com temática GLS, na recepção ficava um computador com acesso livre à internet, uma mini biblioteca, uma sala de reuniões”.


Existia uma sala ao lado da biblioteca, com uma placa no alto do portal, escrito PRESIDENTE “em letras garrafais”. Nos dois primeiros dias em que frequentou a ONG não entrou nessa sala e nem viu pessoalmente o "gay more" que habitava o local. “Era receio, medo e muita vergonha. Mas, tudo isso veio a baixo no terceiro dia. Conheci então, o famoso Sander Simaglio”.


Sander demonstrou ser uma pessoa tímida e engraçada ao mesmo tempo. Muito bravo quando preciso e generoso nas palavras sempre que necessário.André começou então a se envolver mais e mais nos trabalhos da ONG. Sempre admirando as ações de Sander, Marcelo e demais companheiros que faziam parte da diretoria da instituição a qual pegou certo carinho com o passar do tempo.


Passado tempo, o MGA mudou-se para uma casa maior e André ajudou na mudança como se fosse a mudança da sua própria casa. “Ajudei com maior orgulho a carregar os móveis da instituição que hoje tenho tanto amor. Mudamos-nos para Avenida São José, onde estamos até nos dias atuais. É um sobrado lindo, muito iluminado, com uma palmeira imperial imensa na sua frente. Sander escolheu essa casa a dedo!”, revela André.


No dia a dia, Sander e André sempre trocaram olhares. Saíam, viajavam, almoçavam juntos... Tudo que um casal pode fazer juntos, eles faziam, mas até então nunca havia acontecido nada.


Até que um dia, num barzinho GLS, um pouco alterados com uma caipirinha, “bebida preferida dele”, eles se renderam e acabaram ficando. “Ficamos na semana seguinte e não passou disso. Depois de mais ou menos um ano, voltamos a trocar olhares. Rolou novamente e estamos juntos até os dias atuais”.Desde então eles estão três anos juntos. Ambas as famílias são envolvidas no namoro e atualmente, moram juntos e são proprietários de uma loja.


“Aprendi muito com o Sander. Aprendi a gostar de coisa bacana e não dar valor em coisas fúteis. Aprendi que é muito bom viajar. Aprendi também a prestigiar peças teatrais e musicais.” E mesmo com treze anos de diferença a sintonia do casal é perfeita. “Eu o entendo e ele me entendo isso é essencial pra que um casal dê certo”.


André conta que o casal tem a pretensão de oficializar a relação e adotar uma criança no futuro para construírem uma família juntos.




MGA

O Movimento Gay de Alfenas foi criado no dia oito de outubro de 2000. Atualmente tem cede na Avenida São José, 185 no Centro de Alfenas - Minas Gerais.


Oferece inúmeros serviços como assessoria jurídica e psicossocial para população LGBT e PVHA pessoas vivendo com HIV/AIDS. Palestras e trabalhos de prevenção às DST/AIDS em escolas, casas de prostituição, presídios, empresas, dentre outros e distribuição de preservativos e gel lubrificante nestes locais além de motéis, na sede da ONG e datas comemorativas como carnaval, dia dos namorados, dia da mulher, parada gay, carnalfenas, entre outros.


A instituição executa e já executou inúmeros projetos em parceria com Governos Estadual e Federal.


O movimento possui um site, o www.mga.org.br, que é sempre atualizado e oferece maiores informações ao público sobre o movimento e suas ações.