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No limite
Lesões não acontecem somente com Ronaldinho Gaúcho, Gustavo Kuerten e Daniele Hipólito, mas sim com qualquer um. A prática abusiva no exercício físico, ultrapassando seu próprio limite, pode causar graves problemas
Por Jordan Fraiberg
Fotos: Orlando Florin Rosu / Dreamstime
Vaaaaiiiii, um, dois, três, puxou... Virou e quatro, cinco, seis. Agachou... E sete, oito e nove. Aí galera, vamos descansar para o próximo exercício e esse é bem puxado hein.

Percorrendo o corredor ao lado, encontra-se uma ampla sala onde alunos com quimonos derrubam uns aos outros, em exaustivos treinos de judô.

Um treino que faz o atleta sentir todos os seus músculos trabalhando, vê aquela gota de suor caindo no tatame e uma futura dor chegando ao seu corpo. Lá me deparo com Fernando, de 20 anos, que dedica metade de sua vida ao judô. Quem freqüenta academias já ouviu o professor ditando o ritmo para algum exercício ou até mesmo os gritos de força dos judocas, mas algumas pessoas levam esses exercícios aos extremos e acabam sofrendo conseqüências não muito agradáveis. O organismo não está acostumado, em alguns casos, em horas e mais horas de exercícios. O treino deve ser gradual, assim como o esforço exercido nesses treinos. O esporte deve ser praticado por prazer e não por sacrifício.

O estudante Fernando Guedes desde pequeno sentia vontade em praticar um esporte de contato físico. Foi então que descobriu o judô. Lá ele descarregava tudo o que o incomodava durante a semana. Via que o esporte trazia diversos benefícios à saúde e decidiu não parar tão cedo. Entre um mata-leão e uma chave de braço ele conta que o esporte em si o ajuda até hoje, inclusive com bolsa-atleta na faculdade.

O professor de educação física, Daniel Marques, comenta que a atividade física pode ser feita por qualquer tipo de pessoa e de qualquer nível físico. O treino é montado de acordo com o perfil do aluno e de seu objetivo, respeitando os limites de cada um, dentro da individualidade biológica. É preparado um projeto individual. Aqueles que nunca treinaram vão ter uma adaptação neuromotora, fazendo movimentos coordenados, pois ela não está acostumada, em um acompanhamento correto com equipamentos adequados pode haver uma parada cardíaca.

Em todo esporte é costume se ter alguma lesão. Os atletas que participam de diversas competições sofrem muito com isso. Não é difícil de ver aqueles que, após correrem diversos quilômetros acabam caindo exaustos ao término da prova por esgotarem completamente a sua energia. Ou em casos recentes de jogadores de futebol que sofrem uma inexplicável parada cardíaca. Além de lesões ósseas, musculares e articulares às quais estão constantemente sujeitos.

"Fico pensando se nesses prédios, onde se encontram academias, têm professores que vão orientar esses praticantes ou horários fixos para eles treinarem. O que pode acarretar isso? A pessoa fazendo um exercício sem orientação, acima do limite dela, tanto na parte cardiorespiratória como na parte muscular, vai ficar com muita dor no dia seguinte. O professor monta um treinamento, mas antes passa uma adaptação primeiro, essa adaptação vai servir para trabalhar aquela musculatura que está um pouco parada", diz Daniel Marques.

O professor, técnico e karateca, Jefferson Lopes, afirma que todo o atleta deveria ter um planejamento, a qual é chamada de periodização. Porém, no Brasil, a maioria dos atletas não têm condições de contratar um preparador físico qualificado e fazem um planejamento aleatório. "Caso o atleta force mais do que foi planejado, existe uma possibilidade de afetar seu treinamento através de dores musculares, lesões e o famoso ‘over training’ fadiga generalizada tanto física quanto mental", acrescenta o lutador.

A mulher atual busca mais a academia - Nas academias encontram-se muitas mulheres que querem uma forma física invejável. E Santos, por ser uma cidade litorânea, o número é bem maior das que querem exibir corpos perfeitos. Essas mulheres são modernas e têm um metabolismo mais acelerado, porque deixaram de ficar em casa e passaram a trabalhar e sair mais.

A médica cardiologista pós-graduada em medicina do exercício, Cristiane Hellmuth, afirma através de e-mail que dependendo do caso, o esforço intenso pela busca do corpo ideal acaba provocando lesões e a pessoa passa meses sem poder voltar à academia. "Algumas pacientes fazem mais de três horas por dia de exercícios, mas não são atletas", comenta a doutora.

Ela afirma que um teste ergométrico de esforço indica a melhor freqüência de exercícios para cada pessoa.

O também avaliador do Creame Centro de Referência em Avaliação de Medicina no Esporte, Daniel Marques, afirma que, na hora da avaliação física, são perguntados três objetivos a elas, que são: emagrecimento condição física, qualidade de vida e estética.

A busca pelo último item, corre o risco de adquirir lesões em maior número, pois quer fazer isso a qualquer preço. Sujeitando-se a dietas radicais e a fazer treinos extenuantes, querendo ficar bonita a qualquer custo, podendo trazer grandes problemas.

"As que buscam o corpo ideal, acham que vão conseguir esse feito em apenas dois meses, mas não conseguem, até brinco falando que só estarão prontas pro verão do ano que vem", acrescenta Daniel.

A doutora Cristiane identificou três exemplos de abuso: 1- A mulher que quer emagrecer rapidamente e passa a treinar com muita intensidade, gerando muitas vezes problemas no joelho e na coluna, insônia, falta de apetite e cansaço extremo 2 – Aquela que faz uma dieta muito rigorosa e vai treinar em jejum, podendo desmaiar por falta de energia 3 – E, o caso da mulher que quer ficar muito forte e passa a tomar anabolizantes, que podem causar câncer, esterilidade e até morte súbita.

Para os praticantes de fins-de-semana - Quem não está acostumado a dor e lesões do dia-a-dia deve entender que quando realizamos um exercício cuja intensidade e duração ultrapassam o limite individual, nossos músculos começam a demonstrar sinais, pois neles ocorrem microlesões. Na verdade, algumas células musculares se rompem, mas visivelmente não acontece nada. O processo doloroso aparece, com intensidade alta, depois de 12 a 24 horas do exercício feito, sendo chamada de ‘dor tardia’. A dor que aparece durante o exercício resulta num acúmulo de ácido láctico nos músculos.

O praticante semanal ou até mesmo o ocasional devem entender que, se numa segunda-feira acordarem ‘travados’, devem lidar com essa dor e repousar por alguns dias. Precisa evitar de ficar em pé, pois esta posição dificulta a recuperação, e procurar elevar as pernas e realizar exercícios bem leves na próxima vez, como uma caminhada. Se for possível, para acelerar a recuperação, o esportista pode realizar atividades dentro de água morna.

As dores são sinais de nosso corpo, agindo como um mecanismo de defesa, e devemos respeitar esses avisos. O limite físico não deve ser ultrapassado, precisa ter respeito ao corpo. Esse respeito serve para preservar nossa integridade física e também ajuda melhorar nossa saúde.

Ao sair da sala da aula de spinning, com toda aquela música eletrizante e estimulante, me esbarro com todos aqueles garotos que acabam de sair do treino e vão sedentos ao bebedouro. Depois de toda aquela euforia, onde comentam sobre a nova garota que acabou de entrar na turma, vejo a sala de judô.

Caminho calmamente para a porta depois, vejo Fernando estirado no chão, chorando. Rapidamente o ajudam a se levantar e começa a ser carregado por dois companheiros de treino, pergunto o que havia acontecido e entre uma lágrima e outra responde que quebrara o fêmur.