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Desemprego, também em bytes!
Desanimei e me tornei boêmia. Sem perder a classe!
Por Noemi Bragança
Fotos: Noemi Bragança
Meu segundo passo no Second Life, onde entrei para estugar inglês com norte-americanos foi procurar emprego. Minha veia otimista pulsava de alegria ao pensar na inovação da minha empreitada. Seria eu, de fato, a primeira jornalista ou estagiária de jornalismo na mais pura linguagem da Second Life?

Fui na ferramenta pesquisar, digitei Reuters e procurei estágio O auditório virtual era suntuoso, impressionante para uma novata como eu. Não havia nenhum funcionário avatar para me atender. Pareceu-me mera publicidade. Um cartaz na parede anunciava um conteúdo jornalístico em hipertexto disponível para leitura, formato antigo, antiquado. Cadê a interatividade? Cadê o tête-à-tête? Entrevistem-me! Respondam! Esse pequeno mundo alternativo trouxe-me um fantasma da vida real, o desemprego.

Já que não poderia ter uma atividade nobre virei boêmia, coisa que nunca fui na vida real. Ficava até tarde em bares, conversando com estranhos. Virei aventureira. Pulei dentro de um vulcão no Havaí. Voei em um Pégasus. Relaxei em um iate que não me pertencia. Experimentei motocicletas, helicópteros, carros conversíveis. Transfigurei-me em anjo, visitei igrejas virtuais, com uma espada em riste anunciando: "Um recado do Senhor". Blasfemo? Não, é virtual.

Mais tarde, tornei-me guerrilheira e exibia uma metralhadora de melancias. Isso mesmo. Melancias. A futilidade ainda me assombrava, mas me distraia com as minhas andanças e danças, inclusive, de salão, em um clube de jazz chiquérrimo que fornecia vestidos de gala gratuitos.

Enquanto isso, continuava a investir no visual, incentivada pelos elogios espontâneos que uma longa cabeleira ruiva, que adquirira através de uma amiga, suscitara. "Nada que eu adore mais que uma ruiva", um parceiro de dança, que acabara de conhecer, confessou apaixonadamente. Depois disso, parei de tentar ser parecida comigo mesma na vida real.

Um dia, num momento de reflexão entre danças e loucuras, me acometeu uma dessas crises existenciais comuns aos vadiantes.

― Engraçado como a vida acontece. Vim para cá cheia de expectativas. Achei que, assim que chegasse, conseguiria o emprego dos meus sonhos, ganharia muito dinheiro, o mundo cairia aos meus pés. Agora, ao invés de uma jornalista de sucesso, danço por dinheiro.

A conclusão trágico-irônica partiu de mim mesma. Sentada num barzinho bem família, desabafava para pessoas que acabara de conhecer. Leslat Foden era uma stripper com atributos físicos ao estilo da atriz americana Pamela Anderson e Ziggy, seu noivo, era um homem musculoso, de peito tatuado, piercings nos mamilos e cabelos grisalhos. Tipos estranhos, mas simpáticos. Eu sorri miseravelmente:

― Até agora consegui o equivalente a 2 centavos de dólar.

Leslat levantou-se do banco que ocupava num gesto de indignação:

― Você devia fazer o que eu faço. Chego a ganhar 2000 por noite.

― Não, obrigada. Uma jornalista tem que zelar pela reputação, respondi sardonicamente.

― Querida, você acha realmente que o Second Life Times vai ligar para isso?

Loucuras - Esse mesmo casal, levou-me certo dia à sua casa, um lugar localizado a 600 metros de altura em relação ao chão virtual, chamada de Skybox caixa celeste, em inglês. O aluguel de uma Skybox gira em torno de L8000 por semana, o equivalente a 36 dólares, dinheiro que facilmente conseguiam através de suas profissões digitais. Em sua casa, mostraram-me uma banheira erótica, cheia de botões de comandos eróticos. Nas paredes, quadros pornográficos davam o tom. Ou seja, sexo era o hobbie e a carreira desses dois. E de muitos outros também. Dinheiro e sexo parecem ser os principais atrativos desse mundo despudorado que é o metaverso. Nesse aspecto, continuei a mesma da vida real. Tímida e um tanto puritana. Nunca fui às áreas restritas a maiores onde, dizem, ocorrem estupros, assaltos, pedofilia e outros crimes. Em alguns países, até a polícia real investiga.